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A epidemia de zolpidem’: médicos alertam para os riscos

 A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) alterou nesta semana as regras para prescrição do zolpidem, medicamento indutor do sono...


 A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) alterou nesta semana as regras para prescrição do zolpidem, medicamento indutor do sono mais utilizado no Brasil. Na prática, a partir de 1º de agosto, a venda vai se tornar mais rígida por obrigar a apresentação de uma receita azul controlada, em vez de apenas a branca em duas vias. 

Para neurologistas ouvidos pelo GLOBO, a mudança é bem já que o Brasil vive uma “epidemia” de dependência ao remédio. 

 — Vemos com muita preocupação esse uso exponencial do zolpidem. São inúmeros casos de uso abusivo, pessoas tomando sem indicação, misturando com álcool, que começam a se automedicar. É nítido, crescente e estamos perdendo o controle disso, se tornou uma epidemia. Temos efeitos colaterais graves, sonambulismo, alucinação, pessoas se envolvendo em acidentes. E muitos casos de dependência — diz o presidente da Associação Brasileira do Sono (ABS) e professor da Universidade de São Paulo (USP), Luciano Drager.


 De acordo com dados da Anvisa, em 2023 foram cerca de 17,7 milhões de caixas vendidas no país – aumento de 30% em apenas cinco anos. O zolpidem é um remédio para a insônia lançado nos anos 90 que faz parte da classe dos não benzodiazepínicos, ou drogas Z, criada para substituir os benzodiazepínicos. 

Isso porque esses mais antigos foram ligados a quadros graves de dependência e de déficit cognitivo a longo prazo. Ambos atuam nos receptores chamados GABA e, ao se ligarem a ele, “desligam” a atividade cerebral, levando a pessoa a dormir rapidamente. Porém, as drogas Z são mais específicas e, por isso, acreditava-se na época que elas não causariam dependência, o que não se mostrou verdade, conta a coordenadora do Laboratório e Ambulatório de Sono do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas (IPq-HC) da Universidade de São Paulo (USP), Rosa Hasan.

 — No mundo todo começou-se a trocar os remédios antigos por eles. Mas quanto mais tempo uma medicação está no mercado, mais experiência temos com seu uso, e vimos que ela causa sim dependência. Tem casos graves, pessoas que começam a tomar até de dia, porque tem crises de abstinência. Muitas vezes, é preciso internar o paciente para retirar a medicação por causa das crises, ele pode até ter convulsão — diz. 

 Foi inclusive essa ideia de que o zolpidem teria um perfil mais favorável que levou às alterações das regras da Anvisa em 2001, que facilitaram a venda. O medicamento já era enquadrado na lista B1 (psicotrópicos), que demanda receita azul, porém um adendo incluído na época abriu uma exceção. Ele estabeleceu que unidades do zolpidem com menos de 10 mg seriam equivalentes às da lista C1 (substâncias sujeitas a controle especial). Com isso, a prescrição poderia ser feita em receita branca de duas vias. O medicamento é vendido em formulações de 5 mg a 12,5 mg, sendo a de 10 mg a mais comum. 

 Quais os riscos do zolpidem? 

Os especialistas explicam que o zolpidem é um remédio seguro e eficaz, o problema é o uso prolongado
– já que a bula estabelece um limite de quatro semanas para o tratamento – e abusivo, sem orientação médica. — O uso adequado é na dose mínima, por curto prazo. Um exemplo é alguém que fez uma cirurgia, está com dor e não consegue dormir. Ou você faz uma viagem, tem uma dificuldade pelo fuso horário, tomar por poucos dias para se adequar. A chave é ser temporário e com indicação. Mas pessoas com histórico de dependência, gestantes, crianças e adolescentes, o uso é contraindicado sempre — explica Hasan.

 Sem essa orientação adequada, além do risco de criar uma dependência química, há efeitos graves que podem se manifestar no dia a dia, acrescenta Drager: — Ele pode dar tontura, dor de cabeça, amnésia,

sonambulismo, agitação, alucinação. Isso pode ser grave em muitos contextos. Sonambulismo e alucinações são mais raros, mas com o uso abusivo cresce muito. Vemos pessoas fazendo compras online, se envolvendo em acidentes, tudo sob efeito do remédio. E existem indícios de impacto na memória e na cognição a longo prazo. 

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